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Confira a simplicidade e genialidade dos artistas populares

A moça que escolhe o vestido mais novo e se arruma toda para ir à missa no domingo. A baiana que vende seu acarajé. Os orixás, os santos católicos e o sincretismo religioso. As festas de largo, a escassez do sertão ou as cores do Pelourinho. Todos estes são elementos refletidos na arte popular baiana.

Seus protagonistas, homens e mulheres que não aprenderam a ser artistas na escola, exprimem em barro, madeira e outros materiais o modo de viver de uma gente, do povo, e acima de tudo, espelham em suas obras aquilo que viram e viveram.

“A história, o entrelaçamento das raças e o sincretismo religioso na Bahia fazemdo estado um celeiro muito forte para as artes”, afirma Tânia de Maya Pedrosa, uma das grandes admiradoras de arte popular do Brasil, além de colecioná-las.

A colecionadora, que nasceu em Maceió, tem peças de artistas de todo o Brasil, mas mantém a maioria de seu acervo com obras nordestinas. “Apesar de ser de uma família burguesa, sempre olhei com muito valor para a cultura do povo e quando comecei a adquirir as primeiras peças não consegui mais parar. Sou encantada, hipnotizada pela arte popular e hoje em dia dedico minha vida a ela”, revela Tânia.

Família de criador
Dentre os artistas baianos com obras no acervo de Tânia Pedros estão Louco, Louco Filho e Doidão. Nascido em Cachoeira, Louco (1932-1992), apelido pelo qual tornou-se conhecido o escultor Boaventura da Silva Filho, é um dos artistas populares mais famosos no Brasil.


Oxóssi em madeira, de Louco Filho. Em suas esculturas, ele segue a mesma temática do pai, o famoso escultor Boaventura da Silva Filho, o Louco, de Cachoeira
(Foto: S.P.Pepe)

Inspirado pela temática religiosa afro-brasileira, trabalhou e criou por mais de três décadas uma vasta galeria de personagens sobrenaturais em madeiras como jacarandá, sucupira e jaqueira.

Seus familiares, que o seguiram na irreverência das alcunhas, também se projetaram como artistas relevantes da arte popular: o irmão, Maluco, os sobrinhos Maluco Filho, Doidão e Bolão e seu filho, Celestino, que assina Louco Filho. “A obra deles é fantástica e mostra justamente o sincretismo da Bahia”, diz Tânia.

Artista baiano e sacerdote religioso
Nascido em Salvador, no ano de 1917, Deoscóredes Maximiniano dos Santos, o Mestre Didi, é considerado um dos maiores representantes da cultura afro-brasileira.


Escultor, escritor, pesquisador e sacerdote, Mestre Didi é detentor de alto posto na hierarquia do candomblé. Suas formas confeccionadas com contas, búzios, renda de couro e folhas de palmeira são inspiradas em mitos, lendas e objetos de culto aos orixás.
(Foto: Andrew Kemp)

Sua sensibilidade o fez assumir os mais altos cargos da religião africana e também construir uma intensa vida artística. Filho da lendária ialorixá baiana Mãe Senhora, Maria Bibiana do Espírito Santo, Mestre Didi começou fazendo entalhes em madeira, depois vieram os “exus” esculpidos em cimento e barro e suas formas confeccionadas com contas, búzios, renda de couro e folhas de palmeira inspiradas em mitos, lendas e objetos de culto aos orixás.

Entre histórias de terreiros e contos da tradição negra da Bahia, já escreveu mais de 20 livros. Suas obras, que alcançaram grande repercussão, integram importantes acervos de instituições brasileiras, como o MAM de Salvador e do Rio de Janeiro, e estrangeiras, a exemplo do Museu Picasso e do Centro Georges Pompidou, ambos em Paris. A arte de Mestre Didi também já ocupou sala especial na Bienal de São Paulo (1996).

Bahia e África em madeira
Agnaldo Manuel dos Santos (1926-1962) era um simples lenhador da Ilha de Itaparica até que o destino o levou ao ateliê do escultor Mário Cravo Júnior, onde começou a trabalhar como uma espécie de faz-tudo.


Obra de Agnaldo Manoel dos Santos remete à arte africana
(Foto: Divulgação/ Museu AfroBrasil)

Seu jeito simples e trabalhador, no entanto, cativou artistas da época e Agnaldo iniciou-se na escultura com o incentivo de Wilson Cunha, Pierre Verger, José Valladares e Lênio Braga.

Aprendeu a manipular o ferro, o gesso, o oxiacetileno, mas foi com a madeira que o artista se revelou. Suas criações encantaram amantes da arte tanto pela sua qualidade quanto pela interessante semelhança com a arte clássica africana.

Assim como fazem muitos artistas da África tradicional, Agnaldo faz uso de um procedimento para escurecer a madeira por meio de substâncias naturais que acaba tornando-a brilhante, densa e sensual.

A obra de Agnaldo é essencialmente marcada pela pluralidade temática e inspirada nos temas católicos e nos da religiosidade afro-brasileira. Agnaldo participou, em 1957 da IV Bienal de São Paulo, ano em que montou sua primeira exposição individual, no Rio.

Ele participou dos mais importantes salões e mostras pelo país. Em 1987, integrou a exposição Brésil arts populaires, em Paris. Suas obras integram acervos de importantes museus, como o Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro.

Raízes na vida popular baiana
Autodidata, o pintor e desenhista Adelso Filadelfo do Prado nasceu em 1944, em Vitória da Conquista, e aos 13 anos começou seus desenhos fazendo cópias de imagens religiosas e igrejas de sua cidade.


As cores brilhantes e alegres fazem parte das pinturas e desenhos do artista autodidata Adelso do Prado, nascido em Vitória da Conquista
(Foto: Divulgação)

Mais tarde, morou em Salvador e no Rio de Janeiro. Suas criações já foram expostas tanto no Brasil quanto em países da América e Europa e Adelso inaugurou os painéis da Biblioteca Pública Monteiro Lobato (Bahia) e o painel do Salão Nobre da Tribuna de Honra do Estádio do Maracanã (Rio de Janeiro). Sua obra é um exemplo importante de art naïf (arte ingênua), estilo a que pertence a pintura de artistas sem formação sistemática carregada de espontaneidade e criatividade autêntica e instintiva.

As cores brilhantes e alegres, a simplificação dos elementos decorativos, o gosto pela descrição minuciosa, a visão idealizada da natureza e a presença de elementos do universo onírico são alguns dos traços considerados típicos dessa modalidade artística.

Na visão do escritor Jorge Amado, “Adelso tornou-se um artista de indiscutível qualidade, cuja obra, marcada pelo trabalho, pela experiência adquirida, pela dedicação inteira, vem se afirmando cada vez mais séria.Uma coisa, no entanto, ele manteve inalterada: as raízes que o ligam à vida popular baiana, fonte primeira e fundamental de sua criação”.

Pinturas do cotidiano
Waldomiro de Deus fugiu do pequeno município de Itajibá, Bahia, onde nasceu em 1944, aos 12 anos. Percorreu o Brasil fazendo bicos, trabalhando como engraxate, chegando até a dormir na rua.

Aos 17 anos, conseguiu um emprego como jardineiro em Osasco, São Paulo, e encontrou, no fundo da casa onde trabalhava, tintas, pincéis e cartolina. Demitido, já que pintava mais do que trabalhava, começou uma nova, e artística, vida.

Ainda desempregado, pegou algumas cartolinas que havia desenhado e expôs seu trabalho num viaduto onde conseguiu vender duas telas para um americano. Daí para frente, o trabalho de Waldomiro de Deus chamou atenção e ele pôde viver de sua arte.

Com uma técnica bastante própria, que aprendeu sozinho, Waldomiro começou retratando o interior da Bahia, suas festas populares, histórias sobre mula-sem-cabeça e lobisomens.

Por quase 10 anos, chegou a viver na Europa expondo na França, Itália, Bélgica e Holanda. Morando atualmente em São Paulo, já pintou mais de duas mil obras sobre folclore, céu, inferno e situações do cotidiano, espalhadas por colecionadores e museus de todo o mundo.

Bonecas que contam histórias
Personagens que fazem parte do cotidiano e que retratam uma época sãs as principais criações que saem do ateliê de Cecília Menezes. Nascida em Jequié, em 1950, a pintora e escultora passou sua infância numa fazenda.


Madames, baianas, lavadeiras e gente do povo são a inspiração da artista
(Foto: Angeluci Figueredo)

Estudou em Belo Horizonte dos 8 aos 16 anos, onde descobriu seu amor pela arte. Quando voltou a Salvador, os pais não a deixaram estudar belas artes e Cecília fez faculdade de administração, casou e deixou seu lado artista adormecido.

Aos 40 anos, resolveu voltar a pintar e se apaixonou pelo barro. “Ser artista ficou em mim. Comprei telas, pincéis e outros materiais e fui aprendendo sozinha”, conta Cecília, que depois se aperfeiçoou em oficinas e cursos.

“Sou encantada com essa cultura do povo e é isso que retrato no meu trabalho. Minhas bonecas são o espelho do que vi e vejo. A moça que se arrumava pra ir à missa no domingo no interior da Bahia, a lavadeira de beira de rio, as mulheres com seus vestidos de chita e as madames. Estão todas lá”, explica a artista.

Os trabalhos que saem do ateliê de Cecília, em Lauro de Freitas, já correram o mundo passando pelos Estados Unidos, onde teve um de seus objetos adquirido pelo Museu Guggenheimde Nova York.

(notícia publicada na edição impressa do dia 14/06/2009 do CORREIO)

FONTE: Clara Albuquerque | Redação CORREIO

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